Festival de Cinema de Gramado
Sábado (25.08.18) terá Noite de premiação no Palácio dos Festivais
Pela primeira vez na história dos 46 anos do Festival de Cinema de Gramado, a aguardada cerimônia de premiação do evento vai acontecer não só no palco do Palácio dos Festivais, mas também na sua área externa, para que o público e a comunidade gramadense possam acompanhar todos os momentos de perto.
A apresentadora Marla Martins vai conduzir a festa na rua, de onde anunciará os melhores filmes de curta-metragem, longa estrangeiro e longa brasileiro segundo o júri popular. A banda Yangos se encarregará da animação, com apresentações ao vivo para afastar o frio da Serra Gaúcha.
Dentro do Palácio dos Festivais, a festa será comandada pela dupla Leonardo Machado e Renata Boldrini e a trilha sonora ficará a cargo da banda 50 Tons de Pretas.
A celebração começa com a entrega dos Kikitos para os vencedores nas categorias de curta-metragem. Em seguida vem os longas estrangeiros e os brasileiros. O anúncio dos melhores filmes nas três competições será feito em conjunto, ao final da cerimônia.
Ao todo serão 37 prêmios distribuídos, entre Kikitos, prêmios da crítica, do júri popular e prêmios especiais. Também está incluído na conta o Prêmio Canal Brasil de Curtas. O valor total em premiação será de R$ 280 mil, mais serviços oferecidos pela 02 Pós (R$ 20 mil) e pela Cia Rio/Naymar (R$10 mil).
A ordem de entrega dos prêmios será:
Curtas brasileiros
Melhor Desenho de Som (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Trilha Musical (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Direção de Arte (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Fotografia (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Roteiro (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Ator (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Atriz (troféu + R$ 5 mil)
Prêmio Especial do Júri
Prêmio Canal Brasil de Curtas (troféu + R$ 15 mil + garantia de exibição)
Melhor Filme do Júri Popular
Melhor Direção (troféu + R$ 5 mil)
Longas estrangeiros
Melhor Fotografia (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Roteiro (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Ator (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Atriz (troféu + R$ 5 mil)
Prêmio Especial do Júri
Melhor Filme do Júri Popular
Melhor Direção (troféu + R$ 5 mil)
Longas brasileiros
Melhor Desenho de Som (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Trilha Musical (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Direção de Arte (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Montagem (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Ator Coadjuvante (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Atriz Coadjuvante (troféu + R$ 5 mil)
Melhor Fotografia (troféu + R$ 10 mil)Melhor Roteiro (troféu + R$ 10 mil)
Melhor Ator (troféu + R$ 10 mil)
Melhor Atriz (troféu + R$ 10 mil)
Prêmio Especial do Júri
Melhor filme do Júri Popular
Melhor Direção (troféu + R$ 10 mil)
Prêmios da Crítica
Melhor filme em curta-metragem brasileiro
Melhor filme em longa-metragem estrangeiro
Melhor filme em longa-metragem brasileiro
Melhores filmes
Melhor curta-metragem brasileiro (troféu + R$ 15 mil + horas técnica e equipamento)
Melhor longa-metragem estrangeiro (troféu + R$ 40 mil)
Melhor longa-metragem brasileiro (troféu + R$ 65 mil + horas técnica e equipamento)
Crescimento do cinema de animação no Brasil se reflete em Gramado
A 46ª edição do Festival de Gramado tem quatro animações concorrendo aos Kikitos nas principais mostras competitivas. Além dos curtas “Plantae”, de Guilherme Gehr, “Guaxuma” de Nara Normande e “Torre” de Nádia Mangolini, o novo longa-metragem de Otto Guerra, “A Cidade dos Piratas”, foi exibido no Palácio dos Festivais neste sábado, 24, encerrando as projeções dos filmes em competição. Na Mostra Gaúcha de curtas também houve desenhos animados concorrentes, e o homenageado do ano com o Troféu Eduardo Abelin, Carlos Saldanha, é um cineasta consagrado por desenhos animados como “A Era do Gelo”, “Rio” e “O Touro Ferdinando”.
O volume de produções exibidas e da homenagem é reflexo do crescimento exponencial da indústria de animação no Brasil nos últimos anos. “Nesse momento estão sendo produzidos 25 longas de animação no país, uma coisa impensável uns anos atrás”, celebra o diretor Otto Guerra.
O desenvolvimento tecnológico teve papel central nesse cenário, conforme explica Andrés Lieban, sócio-diretor do estúdio 2D LAB, produtora carioca responsável por sucessos como o infantil “Meu AmigãoZão”. “Antes eram só os pioneiros, que estavam principalmente no cinema. Em 1985 houve uma safra de animações brasileiras maior do que de todos os outros anos anteriores. Mais recentemente, veio a possibilidade de os animadores construírem sozinhos os seus filmes, distribuindo pela internet, o que fez a animação chegar a mais lugares sem depender do cinema ou TV”, compara.
É o caso de “Plantae”, de Guilherme Gehr, que aborda a temática ambientalista através da crítica ao desmatamento. Ele fez tudo no filme, à exceção da produção de som, demonstrando a viabilidade de projetos mais enxutos de animação. “É um filme que atinge todos os públicos e estar em Gramado é uma boa oportunidade para debater”, ressalta.
Outro elemento importante no desenvolvimento da indústria de animação são os incentivos governamentais. “O grosso da animação nacional aconteceu nos últimos 20 anos. Só a partir dos anos 2000 que a gente teve esse boom gigantesco, muito por conta das políticas públicas mais voltadas para animação”, aponta Gabriel Carneiro, co-organizador do livro “Animação Brasileira: 100 Filmes Essenciais”, que ganhou sessão de autógrafos em Gramado depois de ter passado por grandes festivais do gênero, como o Aneccy, na França e o Anima Mundi, no Brasil.
Produzido pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine) em parceria com a Associação Brasileira de Cinema de Animação (ABCA) e o Canal Brasil, o livro foi feito em tempo recorde, em apenas seis meses desde a sua fase de pesquisa e seleção das obras, até sua finalização.
O presidente da Abraccine, Paulo Henrique Silva, que é também co-organizador do livro, defende a importância do lançamento: “A bibliografia a respeito da técnica é muito escassa e então sempre existe essa ânsia de ser um livro que fale da história da animação nacional. A gente percebe que a recepção tem sido muito boa por conta desse cenário”, observa.
Gramado como trampolim
Otto é um dos realizadores mais expressivos da animação brasileira. Sua produtora, a Otto Desenhos Animados, completou 40 anos em 2018, e no ano passado ele foi homenageado em Gramado com o troféu Eduardo Abelin, um prêmio que coroou uma longa história que começou com o seu primeiro filme, “O Natal do Burrinho”, ainda nos anos 80, que foi premiado no festival.
“Gramado para a Otto Desenhos, e para todo o cinema do Rio Grande do Sul, tem fundamental importância, por ser um lugar onde as pessoas se encontram sempre”, defende o cineasta.
O seu novo filme, “A Cidade dos Piratas”, que conta a história de um diretor de cinema que está com dificuldades na realização de seu novo filme, é a única animação da mostra competitiva de longas-metragens brasileiros. “Eu esperei para lançar em Gramado porque esse festival é uma vitrine para mim. O que acontecer aqui vai determinar muito do que vai acontecer depois com o filme”, aposta.
Com isso, o Festival de Gramado demonstra que depois de 101 anos de animação no Brasil, os filmes desse formato têm ganhado relevância e espaço no mercado e em festivais, participando de mostras competitivas pelo mundo todo, lado a lado de filmes live-action.“Hoje a gente pode dizer que existe um tipo de animação brasileira, com a cara do país e que leva brasilidade para outros lugares do mundo.”, comemora Paulo Henrique Silva.
Entre o realismo e alegoria, “Mormaço” radiografa as transformações urbanas do Rio de Janeiro
O roteiro de “Mormaço”, primeiro longa-metragem solo da diretora Marina Meliande, ganhou sua primeira versão em 2012, mas as transformações sofridas pelo Brasil e, principalmente, pelo Rio de Janeiro ao longo dos anos seguintes foi crucial para que Meliande chegasse à versão final do texto, filmada em 2016. Tudo começou como um reflexo do momento em que a capital carioca passava após a escolha para ser a cidade-sede das Olimpíadas de 2016.
“A cidade, de uma hora para a outra, ficou muito cara para morar. Todo mundo se viu trabalhando o dobro para manter o mesmo custo de vida. Começou com o processo de especulação imobiliária e transformação urbana e, aos poucos, os fatos foram contribuindo para a discussão desse sentimento de ser expulsa de um lugar, de não pertencer mais a uma cidade e de vivenciar políticas públicas que eram tomadas de cima para baixo, sem consulta popular ou discussão”, lembra a diretora.
Exibido no prestigiado Festival de Roterdã, “Mormaço” conta a história de Ana (Marina Provenzzano), uma jovem defensora pública que, ao se ver às voltas com movimentos de resistência na Vila Autódromo, um dos espaços ameaçados de remoção pela prefeitura para as obras das Olimpíadas, começa a ser consumida, literal e metaforicamente, por uma cidade cada vez mais opressora e conturbada socialmente.
“É o tipo de cinema que me interessa: aquele que reflete os tempos que estamos vivendo — e acho que estamos vivendo tempos muito sombrios”, avalia.
E Meliande viu alguns desses pesadelos de perto: ao descobrir as lideranças femininas de resistência na Vila Autódramo, começou a conviver com a comunidade local, que estava ameaçada de remoção, inclusive instalando o set de filmagens em uma das casas que, no dia posterior ao início das gravações, foi destruída.
“Nós filmamos essa destruição que de fato aconteceu, e foi um dia super tenso e emocionante. Todos tinham direito à terra, com documentação, mas a situação não passava de uma negociata da prefeitura com grandes empresas. Vimos de perto o impacto que aquilo teve na vida das pessoas, mas, ao mesmo tempo, era um misto de emoção e certeza porque percebemos que estávamos contando a história certa”, diz a diretora.
Paralelamente a isso, Meliande registra, através da protagonista Ana – uma mulher jovem, independente, bem sucedida e com vontades próprias -, o retrato de uma geração que ela conhece de perto: “Nesse tempo de idealização do filme, vi todos os meus amigos enlouquecidos, exaustos, exauridos com tanto trabalho apenas para pagar um custo de vida, a ponto de questionarem se o que fazia valia a pena e se não era melhor ir para uma cidade menor”.
Tanto acúmulo de pressões e exigências é representado no filme a partir de uma transformação física sofrida pela personagem e que faz “Mormaço” sair de um relato naturalista e quase documental para chegar ao plano da alegoria, flertando com o cinema de gênero. “O que eu mais gosto no cinema é a possibilidade dessa mescla de gêneros. A minha ideia era evitar um tom panfletário ou didático porque era um tema muito importante pra mim, e o cinema de gênero me ajudou a chegar nesse ponto mais poético, como se a história começasse de uma maneira e fosse se transformando em outra coisa dentro dela própria”.
Em competição no 46º Festival de Cinema de Gramado, onde fez a sua primeira exibição nacional, “Mormaço” tem previsão de estreia para o verão de de 2019.
Velhinha rebelde conquista espectadores em “Violeta al fín”, da Costa Rica
Uma pequena sutileza no título do filme da Costa Rica em competição neste 46º Festival de Cinema de Gramado é a chave para entender a profundidade da obra da diretora Hilda Hidalgo, exibida na noite de quinta-feira (23).
Embora “Violeta al fín” tenha uma protagonista de 72 anos e, pelo título, possa dar a impressão ao espectador de que aborda a história de alguém que se aproxima do final da vida, ele retrata uma mulher que se reinventa. Depois de 45 anos de casamento, Violeta decide pelo divórcio. Pressionada pelos filhos a vender a casa, e pelo banco que cobra uma hipoteca que ela desconhecia ter sido feita, ela luta com os recursos que tem para assegurar seu patrimônio e sua autonomia de pensamento. “O título se refere a um processo de construção, de como ela chega ‘ao fim’ de um processo”, explica a produtora argentina radicada no México Laura Imperiale.
A liberdade de Violeta é seu jardim, um oásis no meio da cidade onde a especulação imobiliária impera. Nele frutificam mangueiras, abacateiros e limoeiros – lá residem também as memórias de seus mortos, da mãe que a ensinou a mexer na terra, do pai. Um mundo ameaçado pelo acordo do banco credor da hipoteca com uma construtora, embate que se ancora na realidade da Costa Rica. “No fundo, é também uma crítica ao próprio país, que nunca pensou em conservar seu patrimônio, sua identidade. Então Violeta não deixa de representar também essa busca do encontro consigo mesmo”, complementa a produtora.
A mesma Violeta que se rebela, é doce no cuidado com as plantas e os amigos, mistura que conquistou os espectadores no Palácio dos Festivais.
Um país com equidade de gênero no cinema
A protagonista da película que dá vida à Violeta, Eugenia Chaverri, consagrou o filme à todas as pessoas da terceira idade, discursando na noite em que foi projetado: “Quando uma pessoa completa 62 anos, ela passa a ser considerada limitada, então essa personagem é um presente para mim, porque me dá a possibilidade de defender essas pessoas”.
O filme também é provocativo sobre o lugar da mulher na sociedade, com Violeta sendo questionada o tempo todo pela ousadia de tomar suas próprias decisões sem dar ouvido a filhos ou consultar o ex-marido.
Esse aspecto feminista do filme, ao mesmo tempo em que reflete o espírito do tempo atual, também é conseqüência concreta do estado do cinema na Costa Rica. O país centro-americano ostenta a raríssima marca de ter equidade de gênero no cinema. “Hoje em dia, mais de 50% dos filmes costariquenhos são dirigidos por mulheres”, revela o diretor de fotografia de “Violeta al fín”, Nicolás Wong Díaz.
Hilda Hidalgo, diretora da obra, é uma dessas mulheres que estão à frente de projetos não só de produção de cinema, mas de fomento à sétima arte, uma vez que as duas principais iniciativas nesse sentido tiveram participação majoritária feminina na Costa Rica: a criação da lei do cinema e a fundação do centro de produção cinematográfica. “Ainda nos falta percorrer muito em termos de equidade de gênero, mas é uma realidade que me parece linda”, celebra Wong Díaz.